domingo, 13 de julho de 2008

OS RETORNADOS

Exemplo de tenacidade e coragem!
O homem de quem vou falar-vos já nos deixou há quase duas décadas, mas não é por isso que deve ser esquecido, bem pelo contrário, são homens como este que nos mostram o que é enfrentar a adversidade sempre com um sorriso nos lábios, mesmo quando a saúde já era de tal forma precária, que cada dia que passava, era encarado como uma vitória.
Foi na sua juventude que deixou a grande Lisboa onde vivia desde rapaz, onde casou, e fez a longa viagem de navio até terras angolanas. Começou pelo planalto, depois mais para sul e por fim a cidade Gabela, onde o ano de 1975 o apanhou. Como muitos também ele acreditava que aquela terra que adoptara era mesmo sua, assim além de ter já um meio de vida que explorava com alguns empregados africanos, já nos últimos anos quando muitos vendiam propriedades em angola, este homem vendeu o que tinha em Portugal, para investir numa roça de café. Claro que como todos os demais, também ele junto com a família teve de abandonar tudo aquilo que construíra com o suor do seu rosto.
Carregou à pressa algumas coisas na sua carrinha e como todos os habitantes daquela cidade, empreendeu a viagem na grande coluna que rumava até à Quibala, onde alguns seguiriam o caminho de Luanda e a maioria com destino a Nova Lisboa. Mais uma vez a má sorte lhe bateu à porta, eram decorridos apenas alguns quilómetros e viu a sua carrinha com tudo aquilo que pensara resgatar consumidas pelas chamas! Apenas com a roupa do corpo, ele e a família, duas raparigas e dois rapazes, chegou a Nova Lisboa onde duas pessoas lhe deram algum dinheiro para as suas necessidades básicas. Mas continuou sempre com o mesmo sorriso nos lábios.
Depois de uma curta estada em Portugal, rumou a um país estrangeiro onde como homem de luta que era, educou tres filhos e adquiriu casa. Quando parecia que a estabilidade fora alcançada, a doença apertou o seu cerco. Primeiro foi uma perna que teve de ser cortada, mas ele com uma prótese, parecia que nada havia acontecido. Depois foi a outra perna! Mais uma vez não se deu por vencido e com duas próteses aprendeu a caminhar sozinho. Mas a doença não lhe deu tréguas e já muito debilitado retornou a Portugal, onde queria passar os seus últimos dias, que seriam efectivamente poucos. Era uma questão de horas segundo os médicos, mas novamente recusou-se a ceder até ver dois netos que tinham nascido por aqueles dias e, quando foi possível que os pais das crianças fizessem a viagem de umas centenas de quilómetros debaixo de um sol abrasador, ele olhou para as crianças, sorriu e morreu naquela mesma noite.
Deste homem guardo gratas recordações e não seria justo comigo mesmo, não narrar a coragem e a luta de alguém que mesmo face à morte, se recusou a deixar-se levar, sem que antes realizasse o seu último desejo.

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