quinta-feira, 28 de agosto de 2008

OS RETORNADOS

Já se passaram uns trinta e tres anos desde que a maioria dos chamados "retornados", tiveram de abandonar as terras do outro lado do Atlantico que julgavam suas e se espalharam pelos cinco continentes. Seria de esperar que ao fim de tantos anos, todos aqueles que vieram na enxurrada de 1975, estivessem completamente integrados nas terras que escolheram ou porventura aquelas donde os seus pais tinham partido há dezenas de anos.
Foi realmente um espanto para mim quando encontrei numa dessas aldeias, um homem agora na casa dos cinquenta anos, completamente inadaptado e mais, embora tenha vivido todos estes anos longe de Angola e das suas gentes, a sua pronuncia é tal e qual a de um angolano, como se tivesse deixado Angola no dia ou na semana anterior. A pronuncia seria o menos, poderia até ser engraçado, não fosse esta pessoa estar completamente dependente do álcool. Continua a trabalhar todos os dias no mesmo trabalho de há trinta e tres anos quando chegou a Portugal, com uma enxada nas mãos, mas é dinheiro ganho e dinheiro gasto na bebida. Tem apenas cinquenta e um anos, mas quem desconhece a data do seu nascimento, fácilmente lhe dá mais de sessenta e cinco anos. Como este, por certo haverá muitos mais por esse mundo fora, vítimas de uns senhores que procuraram fazer política sem estarem minimamente habilitados e o mais curioso de tudo é que em vez de lhes pedirem responsabilidades, são os homens de destaque e de referencia no Portugal que temos.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

OS EMIGRANTES

Chegou a hora da partida
É mais uma despedida
Com a promessa de voltar
É com a face molhada
Que se fazem à estrada
Muitas vezes sem parar.
Passou-se mais um mês
Ainda não foi de vez
Que vieram para ficar
Aguarda-se a mensagem
De como foi a viagem
E se já estão a trabalhar.
E quando dizem adeus
Despedem-se dos seus
Muitas vezes a chorar
Quem sabe se volta a ver
A mãe antes de morrer
Que agora está num lar.

terça-feira, 12 de agosto de 2008

OS RETORNADOS

Ontem tive a certeza que uma grande maioria dos antigos habitantes de Angola, não enjeita serem chamados de "retornados", como aliás fiz referencia numa intervenção que fiz recentemente.
Tenho um familiar que devido a graves problemas de saúde, "AVC", já por mais de quatro anos se encontra internado num lar para idosos, local onde lhe podem prestar os cuidados de saúde que necessita, cuidados esses que a família infelizmente não tem condições para isso. Recentemente conseguimos arranjar um novo lar com umas condições bastante melhores e uma assistencia mais completa, para onde o mudamos ontem. Como acontece sempre com todos nós quando chegamos a algum sítio desconhecido, também esta pessoa idosa se sentia apreensiva, apreensão essa agravada quando esse alguém como este meu familiar, se encontra totalmente dependente de terceiros.
Quando uma das empregadas soube que este novo utente tinha vivido bastantes anos em Angola e tinha regressado na leva de 75, chegou-se a ela e disse simplesmente: EU TAMBÉM SOU RETORNADA! Uma frase simples, mas tão cheia de significado, que foi o suficiente para acalmar esta pessoa idosa, arrancando-lhe mesmo um sorriso, aqueles sorrisos de cumplicidade que trocamos com as pessoas que já conhecemos há muitos anos.
Sim, mais do que nunca continuo a acreditar que esta palavra "RETORNADOS", identifica um povo, povo esse que não se deve envergonhar de assim ser chamado, mesmo que alguns o achem prejurativo.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

OS RETORNADOS

Li algures que alguns dos chamados "retornados" não gostam mesmo nada desta denominação, pois acham que ela é demais prejurativa para que a aceitem. É uma verdade que foi debaixo desta sigla que todos nós fomos descriminados e porventura sofremos quando sem culpa nenhuma fomos arrancados daquela terra que nos viu nascer e despejados numa outra que a maioria nem ser conhecia. Creio no entanto que a palavra "retornados", que alguns como disse se recusam a a aceitar, serve ao fim destes anos todos e falamos em mais de tres décadas, para identificar um povo que agora se encontra espalhado pelos cinco continentes e continua a querer recordar as suas origens.
É deste modo que eu entendo e aceito ser chamado de retornado, embora na verdade este termo não se aplique a mim de direito, como aliás acontece com uma grande maioria, pois não retornamos a nada, porque simplesmente nascemos lá, logo o termo correcto seria apropriadamente "refugiados". Quem faz os possíveis para se juntar nos encontros anuais que a maioria dos antigos habitantes das cidades de Angola continua a fazer, fácilmente se dá conta que é por este termo "retornados" que continuamos a ser recebidos por esses amigos, muitos deles que já não viamos há dezenas de anos. Logo, eu aceito e sou um "retornado".

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

OS RETORNADOS/SAUDADE

Quando nos encontros anuais dos retornados se fala de Angola, nota-se aquele sentimento de saudade de uma terra que marcou todos aqueles que viveram e gastaram as suas vidas em prol de algo que realmente julgavam seu. De todos aqueles que continuam a juntar-se, também se nota a saudade de muitos africanos que ficaram para trás e hoje existe a interrogação se ainda são vivos, ou se a guerra ou a fome que assolou o país, também os vitimou. No meu caso, tinha grandes amigos e antigos colegas de raça negra de quem nunca mais soube notícias.
Será que havia racismo em Angola? Estou em crer que não!
O que era preciso mudar? As grandes desigualdades então existentes e também o dar-se oportunidades iguais para que mais africanos pudessem ter acesso ao ensino superior e assim contribuissem para o desenvolvimento daquela terra que julgavamos ser de todos, sem olhar à cor da pele. Interrogo-me também hoje: onde estão esses colegas e amigos negros e mestiços que preferiram ficar, ou não conseguiram sair como nós? As lembranças continuam, por isso onde quer que estejam, só desejo e, penso que este sentimento é partilhado pela maioria, que sejam felizes e que o seu sofrimento pelos anos de guerra e privações, seja compensado com tudo de
bom.

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

EMIGRANTES

Muitos fazem a viagem
Sem uma única paragem
Com a pressa de chegar
Mais um ano foi passado
Longe do seu povoado
Agora é tempo de voltar.
São muitas as saudades
Daqueles simples lugares
Que tiveram de deixar
Embora seja pequenina
É esta que os fascina
E não deixaram de amar.
Com sorrisos radiantes
Chegam esses emigrantes
Ao seu pequeno lugar
Mas ainda não é de vez
Trazem apenas um mês
Para saudades matar.
Em breve chega a partida
É mais uma despedida
Com o coração a sangrar.